quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Rascunho

Era um sujeito que gostava de anotar todos os seus poemas em rascunhos e simplesmente deixá-los por aí. Esquecidos em gavetas ou inseridos em algum outro monte de papel, os poemas eram concebidos e ali ficavam, como outros tantos.
Jamais pensou em juntá-los em uma coletânia, em escrever um livro de poemas que fosse. Nem mesmo se preocupava em juntar os rascunhos em um mesmo lugar, ele apenas os anotava, rabiscava as suas idéias no papel e as deixava ali.
Não se tem as contas de quantos já escrevera, e nem mesmo poderia os contar, numerosos que são. O que se pode contar é que as suas idéias eram fabulosas. As idéias vinham como pássaros, batendo as asas, logas e abertas, dentro de sua imaginação, subindo e descendo em um céu pintado de azul no plano de fundo.
A percepção era como a de todo o poeta, diferente, mas era diferente de todos os demais, igual. Ele não fora massificado, não possuira opiniões formadas, slogans ou clichês. Possuia um modo simplório de ver as coisas do mundo e de enxergar o que não está ao alcance nem dos olhos nem do coração.
Gostava de deixá-los assim por um simples motivo. Os poemas surgiam de um momento, e o descreviam por completo, citavam cada elemento que o compunha, cada sentimento envolvido, cada visão, e assim, como o momento que passa em uma fração de segundos, ficava imortalizado. Imortalizado em rascunho o poema era deixado, para quem quisesse estava ali. E, quando em outro momento qualquer, alguém o encontrasse, descreveria como ninguém poderia o que ali se passou.
Certa vez tive a felicidade de encontrar um destes momentos - se me permitem uma correção, o momento não estava perdido, estava simplesmente no lugar em que deveria, então, de fato, não o encontrei. Estava desenhado em palavras, em uma folha amarela, amarrotada, e com um dos cantos rasgado. Se não tivesse me deparado com a forma tão peculiar com que as palavras desenhavam folha, a teria amassado e depositado na próxima lixeira que viesse de encontro a mim.
Encontrei-o pregado na contracapa de um livro. O momento fora descrito no verso do papel, e falava de um céu cinza, uma cama sem colchão e quatro paredes brancas. Não havia som de pássaros e nem de rios, haviam bipes descompassados e uma floresta de sensações. Quanto mais adentrava-se na floresta mais estranho se sentia dentro do seu próprio pensamento...
Já não sabia quem era, não poderia saber se possuía personalidade ou se realmente estava ali. Mas tudo o que sentia era a vontade de caminhar, de seguir em frente e descobrir o que viria. Ao final de tudo, um encontro com um senhor de sobretudo preto, um céu que se abria em azul cintilante, e um suspiro.
Ficaram os momentos eternizados por sua percepção. E eles estão por todos os lugares, para quem os quiser. Se cruzar com algum deles pelo caminho, conte-me.

sábado, 19 de setembro de 2009

Ditado

Se fizesse de minha vida
Um livro de poesia
Não sei bem como seria
Quando fosse pra ser lida

No prefácio colorida
Tal manhã de um lindo dia
E o texto que varia
Ora alegre, ora sofrida

Mas que fique registrado
Uma coisa que bem sei
Mandaria por ao cabo
Um ditado que guardei:

'Não fui mago nem fui rei
Nem combatente ou soldado
Mas fica imortalizado
O território em que pisei.'

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Versos Meus


Poeta

Sempre fui simples sujeito
Para todo o predicado
Fosse esse homem direito
Fosse desavergonhado

Lidava com o respeito
Quem comigo fosse ter
E fui muito bem aceito
Como exemplo de se ver

Mas chamaram me poeta
Foi que tudo se danou
Nem poesia nem métrica

A ilusão me dominou
Fugi pois de minha reta
Pro lugar em que estou

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Superando somente limites.



Acho que a imagem da semana é esta que vemos no vídeo, o homem novamente superando os seus limites. E como é interessante fazer a comparação com tempos passados, e notar como a evolução das técnicas e tecnologias nos permitem chegar mais longe. Outro bom exemplo foi o acidente sofrido pelo piloto brasileiro Felipe Massa durante o treino na Hungria, não fosse a tecnologia aplicada no capacete - ou fossem outros tempos - com certeza as consequências seriam bem mais graves.
O que me levou mais a fundo mesmo foi esta ideia do homem estar superando sempre os seus limites, e sempre somente os seus limites. Esta ideia se torna mais clara se colocarmos no papel quantas guerras estão acontecendo neste momento no mundo - sim, todas elas, inclusive as quais não sabemos que estão acontecendo - e não somente as guerras por territórios ou poder, mas as guerras pela paz, as guerras pela vida e todas mais...
Como pode o ser humano chegar tão longe? Como pode ele ser capaz de superar os seus limites a tal ponto sem entretanto jamais superar os seus preconceitos e suas ganâncias - a sua mediocridade?
Isso prova o quanto somos pequenos, o quanto somos frágeis. Estamos sempre nos preocupando em colocar motivos para justificar tudo o que fazemos, e assim nunca abrimos os olhos para os próprios erros. Não sou digno de apontar aos outros e dizer que estão errados, pois tenho também minhas fraquezas e minhas mediocridades, mas sei que ao menos é a minha consciencia que controla os impulsos elétricos que circulam entre um neurônio e outro dentro de mim. E sei que agora minha consciência está limpa, pois estou sempre apontando para mim mesmo, e reclamando dos meus erros.

Fica uma grande lição que um dia ouvi, e vou levar para a vida toda:
Se você anda por um caminho e tropeça num buraco, e, quando se recompõe, culpa o buraco por estar no seu caminho, amanhã você vai tropeçar no mesmo buraco deste mesmo caminho; mas, se, ao invés de culpar o buraco que está no seu caminho, você assumir que tropeçou por não tê-lo visto você jamais tropeçará nele de novo, pois, quando andar por este caminho, se lembrará que por ali já tropeçou algum dia.

Assuma a sua responsabilidade como ser humano.

domingo, 16 de agosto de 2009

Tomado de Assalto.

Um cidadão que, envolto em seus pensamentos, acompanha as paisagens que passam pelo vidro de um ônibus, ouve o rapaz logo ao banco de traz lhe dizer: "Quieto, isto é um assalto, vai passando o que você tem." Como que em um salto ele 'recobra' a consciência e percebe-se cercado pelos que o assaltam.
É neste momento que percebe: "não sei como reagir, não sei o que fazer. Afinal, nunca fui assaltado antes!" Ironicamente, ele não foi tomado de assalto apenas pelos assaltantes, foi tomado de assalto por sua inexperiência. Até então os únicos assaltos que ele conhecia eram os de programas de comédia na TV - daqueles em que a arma do bandido acaba atirando água. Aliás, ele havia assistido muita TV ultimamente.
Há tantas notícias de violência, do crescimento dos homícios, das fulgas de presidiários, da polícia que vira bandido. Há tanto sangue! Como ele, justo ele nunca havia sofrido dessa violência.
Não é preciso muita experiência em assaltos para entender o mecanismo da coisa. Não se precisa muito para saber que a idéia central é você 'doar' seus bens aqueles que o estão reclamando. Mas ele esteve ali, inerte em seus pensamentos, reparando em quantas situações já não fora tomado de assalto.
Quantas vezes não ficou preso nas janelas de paisagens que passam na mente? Quantas vezes não viveu em meras ilusões? Como soube estar vivendo o primeiro amor? E a primeira proposta para noivar? E o primeiro filho - tão assim de repente - como saberia ser pai? Quantas primeiras vezes aconteceram e quantas viriam?
E os sentimentos? Quantas vezes não o trairam e o elogiaram? Já fora tomado de assalto diversas vezes por eles. Um choro ressentido por não ter conseguido um emprego. Um sorriso contagiante ao ver os seus pais lhe esperando em casa. A explosão do abraço daquele amigo que há muito não encontrava. O suspiro ao se emaranhar nos braços do amor. As surpresas que a vida lhe trouxe.

O cidadão então percebe que tem um curriculum grande e variado de assaltos, mas nenhum como esse. Alguns podem ter sido até mais perigosos, mas nunca lhe tiraram assim de sopetão os seus bens. Ele, retornando dos seus pensamentos, olha nos olhos dos assaltantes e diz:
- Acho que agora sou mais um nas estatísticas sociais.
Os bandidos inquietos e irritados pela demora compreendem do que se tratam as estatísticas do tal cidadão, mas insistem para que ele passe logo os bens antes que alguém os perceba. Este assalto está lhes tirando muito tempo!
O cidadão retira todo seu dinheiro da carteira, e passa junto com o relógio e o celular para os bandidos e lhes diz:
- Acho que agora vocês são mais um nas minhas estatísticas.
Os bandidos se entreolham sem entender. Pegam tudo e descem do ônibus antes que alguém perceba o que se passou ali.

[...]